Quero poder dar a mão à minha namorada sem sentir que estou a dar um espetáculo

Quero poder dar a mão à minha namorada sem sentir que estou a dar um espetáculo

Ana é lésbica e sempre se assumiu desde criança. A sua ainda tenra idade fez com que tudo parecesse mais simples pois nasceu num país dito “liberal”, numa época em que as pessoas já aceitam a homossexualidade. Mas ainda se sente discriminada quando passeia com a sua namorada. Ana conta quais os tabus que ainda faltam vencer, e aponta o dedo aos comportamentos errados por parte das pessoas.

Era uma tarde como outra qualquer. As pessoas regressavam do trabalho e era hora de ponta. No metro, muita gente em pé, metida nos seus telefones e livros. Nos bancos da frente, um rapaz e rapariga riam abraçavam-se davam um beijo ou outro. Ninguém olhava.” Eu e a Raquel demos as mãos. Começamos a sentir olhares indiscretos. Uns risinhos de uns rapazes praticamente homens nos bancos mais à frente. Algumas pessoas faziam um olhar enjoado como se eu tivesse acabado de fazer algo muito errado. Mas afinal, o que é que fiz de mal?”

Ana conta como as pessoas reagem de forma totalmente diferente quando veem um casal do mesmo sexo. E como mesmo os amigos se comportam de forma distinta.

“Quando nos apresentaram como o casal lésbico não me senti confortável. Foi como apresentar alguém com um problema, com uma condição de saúde. Não deixa de ser verdade que somo um casal de lésbicas mas ninguém apresenta um casal amigo como “o casal heterossexual ou o casal de surdos”. “Outra coisa que não gosto que me perguntem é quem é o homem da relação. Mas será que as pessoas não entendem que continuamos a ser as duas mulheres?”

Na universidade, no trabalho, na vida social. Os olhares constantes, a discriminação persistiu. “Uma vez num ginásio atacaram-me nos balneários. Disseram que não trocariam de roupa à minha frente com medo que eu as assediasse. Uma rapariga uma vez incomodou-se de eu estar a olhar literalmente para a sua saia. As pessoas pensam que somos o quê? Que não nos controlamos? Ainda existe um estigma muito grande em relação à homossexualidade. E no caso das raparigas, se não usamos cabelos curtos e calças assumem que somos bissexuais, e recebemos convites meio gozões para experimentar coisas a três.”

Ana diz que sente falta de poder ser ela própria, sem os olhares, sem assumirem que ela é algo que não é. Nunca teve amigas pois elas acabavam por a discriminar. “É como se tivessem medo de mim. Seria o mesmo que as raparigas heterossexuais não terem amigos homens. Para mim nunca fez sentido.”

O apoio incondicional da família fez com que nunca passasse por um período de depressão e isolamento. Mas Ana tem consciência que muitas raparigas não têm a mesma sorte. “Ser gozada na escola, rejeitada por sentir atração por pessoas do mesmo sexo é injusto. Hoje em dia as coisas estão melhores. Mas ainda é muito difícil”.

Quando lhe perguntamos o que é que quer que as pessoas saibam, e como gostava de ser tratada Ana sugere: “ Deixem-nos viver a nossa vida, não nos julguem e não olhem para nós de forma diferente como olham para as outras pessoas. Não somos bichos não vamos assediar ninguém nem queremos chocar. Apenas quero poder ter uma namorada tal como as minhas amigas têm namorados”.

About the author

Related

JOIN THE DISCUSSION