“O meu pai é gay”

Um texto de Afonso, 53 anos, que lutou interiormente quando contou ao filho Tomás, de 25 anos, era na verdade homossexual. Na verdade, foi mais do que isso. Afonso lutou a vida toda. Negou durante muitos anos a sua orientação sexual. Um texto para refletir.

Sempre soube que era homossexual. Mas sempre o neguei. Na escola gostei de rapazes, tive paixões passageiras mas logo percebi que isso não era o mais comum entre os rapazes da minha idade. Desde os 12 anos que o meu objectivo era encontrar uma namorada. Tinha de me “curar” e ser “normal”. Viviam-se tempos em que não era fácil alguém assumir-se e a religião tornava as coisas ainda mais difíceis. Arranjei a primeira namorada aos 14 anos, mas era muito complicado. Não sentia desejo, não tentava nada sexual com ela. Ela achava-me cavalheiro.

Mais tarde tive outros namoros e aprendi a ter prazer. Usava alguns truques, e fingi namoros inteiros. Se fosse bissexual seria mais fácil suponho.
Quando conheci a Rita, agora minha ex-mulher, achei que seria a mulher ideal. Trabalhadora dedicada à carreira, não queria filhos. Mas nasceu o Tomás. Não me arrependo disso claro. Mas sentia-me preso, afinal de contas um filho era uma responsabilidade maior ainda do que o casamento, pelo menos na minha visão. Tentei “curas” mais fortes. Via filmes heterossexuais mas em momentos mais frágeis fantasiava com o que gosto. Consegui viver uma vida dupla mas tive várias depressões. A Rita achava que era por causa dela.
Quando nos divorciamos o Tomás já era adulto. E eu já era livre. Conheci o meu actual companheiro mas senti-me com um verdadeiro peso em cima por ter de contar ao meu filho o que era.

Um dia ouvi-o contar a um amigo “O meu pai é gay”, antes de nos apresentar. Não sei se me senti bem por ele não ter vergonha de o dizer aos amigos, ou se notei a desilusão enquanto ele proferia as palavras. Mas sei que foi difícil para ele lidar com isso, principalmente por eu o ter escondido durante tantos anos.

O meu filho achou que nunca amei a mãe dele. Isso não é verdade. Há muitas formas de amor e a Rita foi um pilar fundamental. Teria ficado sozinho se não fosse ela, nunca teria tido o Tomás. Mas não deixou de ser um erro pois quem acabou por sofrer mais foi ela. Se fosse hoje faria tudo de forma diferente. Apesar de ainda existir homofobia, os jovens de hoje têm muito mais sorte, e podem viver uma vida normal. É essa a mensagem que quero passar ao Tomás. Espero que ele respeite todas as pessoas, independentemente da sua orientação ou género.

About the author

Related

JOIN THE DISCUSSION